quinta-feira, 4 de setembro de 2014

ARTIGO - MAIS ATITUDE E MENOS RÓTULOS

Mais atitude e menos rótulos
Por Fabrício Lopes*

Cotidianamente assistimos posicionamentos da nossa população que imputam à quem milita nos espaços políticos a culpa por todos os males que afligem nossa sociedade. Essa descrença e desconfiança não é algo novo e tem suas razões para existir, pois há quem ocupe esses espaços e não fazem por onde merecer nosso respeito.

Infelizmente somos carentes de grandes experiências que possamos visualizar como transformadoras e que pudessem possibilitar aos cidadãos ter um olhar para além do senso comum, que possui o equivoco de responsabilizar apenas os governos por problemas que são responsabilidade de todos.

Vale lembrar que nos casos dos problemas ocasionados exclusivamente por mandatários, essa responsabilidade também está em nossas mãos, afinal quem se convencionou a reclamar e não fiscalizar é o mesmo que o elege.

Estar na política é papel de todo cidadão que se preocupa e se sente preparado para fazer, a partir de sua atuação individual e coletiva, ações que possam promover e desenvolver um Estado funcional que transforme a vida dos cidadãos.

O processo eleitoral que se avizinha traz a tona as mais diversas opiniões sobre os rumos e os desejos do nosso país. Porém, chega um momento em que é preciso questionar até quando os temas que são apresentados são, de fato, importantes para a melhoria das condições e da qualidade de vida coletiva das pessoas. Até mesmo refletir se servem para algo que realize transformações estruturantes, ou se é apenas para buscar polemizar a partir de estigmatizações, que após esse período caem no esquecimento.

A maioria destes assuntos, impostos de maneira enviesada no debate eleitoral, são sobre temas delicados, que precisam ser tratados com mais carinho e cuidado. São essencialmente pautas que dialogam prioritariamente com as garantias dos direitos humanos e minorias.

O resultado é trágico: uma proporção imensa de assuntos que não são tratados com a devida importância fora do período eleitoral, inclusive pela falta de espaço das estruturas existentes, enquanto no período eleitoral se tornam chavões de idolatria, salvação, ódio ou repugnação dos candidatos.

Penso que todos assuntos precisam ser debatidos até seu esgotamento, porém é necessário compreender que sem um Estado adequado a receber essas demandas e mais eficiente na formulação e implementação de políticas públicas, continuaremos a viver uma guerra eleitoreira que contamina e domina o estágio atual da luta política, sem que resultado algum seja alcançado e o Brasil permaneça atrasado em média de 20 anos em relação ao mundo.

É preciso aproveitar esse momento em que estão todos de alguma forma voltados à atividade política e trazer para a discussão assuntos que possam apontar alternativas ao modelo burocrático atual. É necessário buscar um modelo mais flexível, com serviços de melhor qualidade, maior participação popular nas decisões.

Este método que diz tomar decisões pautadas pelos ditos “especialistas” está esgotado. Pagamos o preço de não ter um estado que funcione e nos decepcionamos ainda mais com as produções televisivas dos marqueteiros das campanhas que mostram a nós um país irreal.

É necessário compreender que a Gestão Pública deve ser tratada com mais seriedade e o debate acerca das mudanças estruturais do estado, que deveria estar presente neste momento eleitoral, não se resume à criação ou diminuição de ministério, como tentam pautar os “formadores de opinião”.

Não podemos ver constantemente ser diminuída a importância do trabalho do setor público, como se nele estivesse concentrada todas as mazelas sociais. Importante lembrar que o Poder Público é formado por cidadãos e que no exercício de suas funções também devem se sentir parte das decisões.

Se o Estado é ineficiente, sua força propulsora não é exercida e ele se torna matéria de questionamento por parte daqueles que estimulam a despolitização da população, porém não vivem sem disputar um mandato.

Precisamos enveredar esforços para combater especialmente a corrupção, corrupção em todos os níveis. Desde um taxista que faz o caminho maior com seu passageiro “estranho”, ao grande empreiteiro que se beneficia de obras públicas conquistadas a partir de licitações realizadas com cartas marcadas entre outros empresários do ramo. Do atendente do hospital que coloca seus amigos no inicio da fila de consultas ao mandatário que usa as obras públicas como barganha para a próxima eleição.

Cabe a cada um de nós exercitar cotidianamente nossa capacidade de intervenção na sociedade, ao invés de somente reproduzir aquilo que aparentemente é mais verdadeiro nessa atual enxurrada de informações. Dispomos hoje de um numero maior de instrumentos de participação, fiscalização e transparência, mas ainda insuficientes e de difícil acesso a maioria da população.

Chegou a hora de mudar essa realidade. Todos podemos fazer parte dessa transformação. Participar, agir, conhecer, compreender, socializar, são apenas alguns passos que podemos dar no sentido de construir uma sociedade mais justa para nós mesmo e deixar algum legado positivo para as futuras gerações. O Brasil não aguenta mais esperar!
  

*Fabrício Lopes é Gestor Público

terça-feira, 10 de junho de 2014

ARTIGO - A FORÇA QUE PODE MUDAR O BRASIL

A força que pode mudar o Brasil
Por Fabrício Lopes* e Dalmo Viana**


Por muito tempo o Movimento Estudantil foi o único canal de diálogo e pressão da juventude brasileira para conquistar avanços nos direitos enquanto cidadãos e na defesa do país. A partir da Constituição de 1988 e o advento da inclusão dos conceitos da democracia participativa, além de maior perspectiva no compartilhamento das ações, decisões e transparência do estado, proporcionaram um ambiente onde diversos atores do movimento juvenil pudessem se apropriar de diversas ferramentas e espaços para protagonizar novas lutas.

Com a abertura de novos espaços de discussão e a proposição de novas agendas, diversos movimentos passaram a se organizar e fortalecer. Isso possibilitou a abertura de diversas outras frentes de atuação que hoje inclusive apropriam-se dos meios tecnológicos para difundir suas idéias e conquistar adeptos.

Cada vez é mais visível a participação da juventude nos espaços de criação, desenvolvimento e operação das políticas, porém esse numero ainda é pequeno se entendermos qual o verdadeiro potencial dos nossos jovens e o tamanho de sua participação na sociedade.
Ainda possuímos diversas lutas a realizar, é preciso pensar o tema para além do conformismo de que “um dia já foi pior”. Não podemos deixar ressoar os pensamentos dos porta-vozes do conservadorismo que visualizam os jovens apenas como elementos estáticos e tutelados.

Nos últimos anos, através especialmente das pressões realizadas pelos movimentos juvenis organizados, conquistamos diversos avanços institucionais, entre as quais destacamos a aprovação da Emenda Constitucional nº 65 (PEC da Juventude) que insere e reconhece a juventude como sujeito de direitos na Constituição, a realização de duas Conferências Nacional de Juventude, que apontaram demandas, anseios e desafios através da voz da própria juventude e o Estatuto da Juventude, diploma legal de direitos para os jovens entre 15 e 29 anos, o qual ainda carece de um Sistema Nacional de Juventude com regras claras de financiamento de politicas publicas que estejam em sintonia com as necessidades dos jovens.

Além disso, necessitamos fazer um debate sério em torno do Plano Nacional de Juventude, que possui um texto arcaico em tramitação na Câmara dos Deputados e nem de longe representa as necessidades atuais da nossa juventude.

Esses esforços se fazem necessários para que não coloquemos em risco o que já foi conquistado. Devemos lutar pela construção  instrumentos políticos fortalecidos, para não corrermos o risco de ver direitos deturpados ou engavetados por gestores públicos sem compromisso com a temática. 

A juventude brasileira já esperou demais. Neste momento da nossa história se faz necessária uma grande avaliação e a redefinição de rumos, inclusive no que tange ao papel dos nossos militantes políticos nestas lutas. ‘E preciso criar sintonia real com os movimentos populares, com as administrações de municípios e estados, mas sobretudo dialogar com a grande massa de jovens que não possuem condições e acessos aos espaços formais de organização. 

Ninguém é capaz de resolver tudo sozinho, por conta disso é necessário que esse debate venha a partir da unidade de forças, sempre considerando o potencial estratégico de todos os agentes que constroem cotidianamente a luta em torno do tema. Os processos precisam ser amplos e democráticos, devem estar atrelados às necessidades levantadas pelas vozes das ruas e não aos pensamentos mofados daqueles que só enxergam um pequeno mundo a sua volta. 

A juventude brasileira anseia por agentes políticos que ajudem verdadeiramente na organização e na defesa dos nossos direitos. É preciso romper como atraso em relação a implementação de políticas eficazes a que fomos obrigados a conviver nas últimas décadas. Já basta daqueles que somente se utilizam da juventude como peça publicitária em suas campanhas eleitorais. 

O tempo é de construir uma nova perspectiva junto a essa nova geração de brasileiros, tornando imprescindível a construção de uma agenda propositiva que entenda de fato o jovem como cidadão e dê condições de tratamento e inclusão diante das suas especificidades culturais, sociais, econômicas e territoriais. 

Além da desestruturação do Estado e o conservadorismo político, estamos  contra o tempo, pois os jovens da geração deste bônus demográfico veem escapar muitas possibilidades de constituir uma nova fase de desenvolvimento para o país. Já não bastasse o atraso que estamos relegados, isso pode causar uma prejudicialidade ainda maior no futuro caso não fomentemos ações dinâmicas e coerentes com a realidade que vivenciamos. 

É preciso ousar mais, deixar as ideias fluírem sem medo e investir muito na criatividade do nosso povo. O momento é agora, sem medo do dialogo. Jovens camponeses, indígenas, urbanos, quilombolas. Homens e mulheres, trabalhadores e desempregados, estudantes e analfabetos. Deve ser nosso compromisso estar ao lado dos que mais necessitam nessa hora. Os jovens brasileiros são a força que pode transformar nosso país um lugar melhor para se viver. Que a mudança comece por cada um de nós.


*Fabrício Lopes é Gestor Público e ativista das Políticas de Juventude
**Dalmo Viana é Sociólogo e militante do PSB/SP

terça-feira, 23 de abril de 2013

ARTIGO - UM OLHAR NO FUTURO


Um olhar no futuro
Por Fabrício Lopes* e Thiago Higino**

Ao longo de muitos anos a juventude foi tratada como elemento secundário da política e criticada por sua forma de inovar os conceitos e as práticas. Chamados diversas vezes de inconsequentes, enfrentaram duramente a mentalidade conservadora que não ousava enxergar o quanto futurista são os desejos e anseios deste segmento da sociedade.

Ao invés de reprimir, era necessário investir. Mas os administradores da nação e seus apoiadores viam na juventude apenas mais uma força de trabalho e que sua ocupação deveria se dar apenas pela reprodução dos modelos já instituídos. Não anteviam com o olhar destes jovens que o mundo se aproximava cada vez mais de uma grandiosa transformação no modo de agir, pensar, comunicar e até de se relacionar.

O tempo passou e as oportunidades ficaram, mas o sonho não acabou. Foi necessário a construção de um projeto político popular, que deu ênfase ao tema e ouviu os anseios futurísticos da nossa geração para abrir espaço e compreender que muito tempo já havia sido perdido sem o devido investimento na mola propulsora do desenvolvimento do país.

Extrovertida, dinâmica, comprometida, visionária, comunicativa, entre outras, são características da nossa geração que somente agora conquista os primeiros espaços junto à sociedade e aos entes governamentais. Ainda é possível recuperar o tempo perdido, inovar em conjunto com esta geração de mais de 50 milhões de jovens e, por meio de métodos criativos, permitir que a própria juventude construa a sua história e perspectiva do amanhã.

Há muito trabalho para ser desenvolvido, muitas idéias que precisam ser melhor trabalhadas, muitos corações e mentes a ser convencidos, mas precisamos encurtar as distancias, fazendo das nossas organizações primeiramente instrumentos de luta pela garantia, afirmação e constituição de direitos.

As lutas que se constituíram na busca destes direitos, até a promulgação da Emenda Constitucional que incluiu a juventude na Constituição, deram visibilidade ao tema e nossa geração teve a oportunidade de começar a ocupar espaços anteriormente cristalizados e restrito somente a uma minoria.

Mas isso não é o suficiente, é apenas o inicio da forma do Estado e das pessoas enxergarem o tema como prioritário e não tratar de forma secundária milhões de brasileiros e brasileiras que anseiam a oportunidade de ter acesso, de forma digna, a direitos básicos, como Saúde, Educação, Esporte, Moradia, Transporte, que possuam as características desta nova geração e não carregue os vícios do século passado.

É fundamental o debate intergeracional, mas temos de convir que as gerações que nos antecederam tiveram outras pautas mais pontuais a serem desenvolvidas, fato este que não possibilitou a sua dedicação na busca de afirmar estas posições. Entendemos que é quase impossível falar em conquista de direitos em uma época onde o direito primordial de se expressar era tratado com as mais duras penalidades do período ditatorial vivido pelo Brasil.

O momento agora pede mais empenho e dedicação, sem disputa de vaidades e com o compromisso de erguer e firmar um país que tem crescido vertiginosamente. Porém, agora é a vez de criar políticas que assegurem e mantenham estas conquistas.

Neste sentido, a aprovação do Estatuto da Juventude e a rediscussão sobre o Plano Nacional de Juventude se faz pertinente o quanto antes. Somente assim vamos efetivar o primeiro passo verdadeiramente para constituição de políticas públicas que assegurem à nossa geração direitos anteriormente ceifados e permitam às futuras gerações constituir com sua forma de ver o mundo o modelo de política e país que tanto desejam.

Com as transformações tecnológicas, em espacial, aquelas voltadas aos meios de comunicação, ganhamos a oportunidade de utilizar esses meios a nosso favor, permitindo a essa juventude o acesso a essas tecnologias e utilizando nossas universidades como centro avançado de pesquisa no desenvolvimento de novos instrumentos.

Não é difícil entender que, quando nós investimos na juventude, nós estamos investimos no futuro da humanidade. Esforços não devem ser poupados. É preciso haver sintonia entre o custeio público e as prioridades com olhar no futuro. A retomada já começou e precisamos desde já trabalhar na construção de novos caminhos. Sinta-se convidado.


*Fabricio Lopes é militante do Partido Socialista Brasileiro
**Thiago Higino é Secretário Nacional de Políticas Públicas de Juventude da JSB

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Marcha da Maconha. E eu com isso?


                                             Márcia Rebeca*




A sociedade brasileira passa por intensas transformações -principalmente as da ordem social-  todavia, a intolerância nos ronda. Ocupar às ruas em defesa da descriminalização da maconha é pedir ao Estado que crie mecanismo para controle e produção, e isso não é apologia. É tratar a questão de frente.

Qualquer droga, seja ela qual for (álcool, medicamentos, chás, maconha, etc) tem seus efeitos colaterais. E talvez nenhum seja tão devastador quando a marginalização dos usuários, produzida pela sociedade. O modelo da guerra às drogas, da política proibicionista trata com polícia uma questão de saúde pública, gerando violência, com jovens matando e morrendo. Logo,essa lógica continuará acontecendo enquanto se faz vista grossa ao debate.

Aí perguntamos: a quem serve essa guerra? Eu digo que serve a quem explora a justificativa de que a criminalização dará conta de acabar com o consumo, e não vai. É preciso que haja a regulamentação da cadeia produtiva, com a arrecadação de impostos e estabelecimento de regras e limitações para a venda e o consumo; mas, acima de tudo, é preciso que cada um de nós percebamos que temos sim muito haver com processo histórico e social da Marcha da Maconha, e isso se dará a partir do momento que a sociedade passe a refletir sobre o tema, com responsabilidade e a coragem necessários para transpor as barreiras da intolerância.


* Professora de Química e acadêmica de Ciências Sociais

Foto: Sérgio Neglia

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Eu faço política

Por Márcia Rebeca

“Se aos socialistas se atribui a utopia como pecha, como incapacidade romântica de adequação a uma realidade que se propõe insuperável, deve-se apresentar aos conformistas, das mais variadas ordens, a fatura da distopia.”
Carlos Siqueira




Eu faço política porque o que me cerca me causa desconforto. Por que ver mães em filas gigantescas durante a madrugada, em busca de uma vaga na creche me deixa indignada. Por que acho um absurdo jovens não terem o direito de sonhar com um futuro melhor, pois a educação no nosso país ainda deixa a desejar. Eu poderia ficar aqui horas dizendo por que faço política, mas o motivo mais simples e o mais completo é que faço política por acreditar que posso ser instrumento da mudança, de uma sociedade em que predominam as diferenças para uma sociedade em que todas e todos tenham as mesmas oportunidades.

Para fazer política é imprescindível dedicar-se a uma causa. Às vezes fazemos política e nem nos damos conta. Quer ver? Quem aí nunca discutiu sobre a burocracia no Brasil, sobre como seria mais fácil se não houvesse e defendeu inúmeras teses? Pois é, você fez política ao defender seu posicionamento. Alguns setores da sociedade tem se mobilizado por diversas causas, aqui em Manaus temos exemplos em 2009 quando o prefeito Amazonino decretou a redução da meia-passagem estudantil e centenas de estudantes (eu entre eles) foram as ruas durante dias seguidos em busca de reaver um direito perdido. E em 2010 quando a CMM aprovou a Taxa do Lixo desencadeando um movimento que surgiu nas redes sociais  com o propósito de divulgar o nome dos vereadores que foram favoráveis ao projeto. Em 2011 novamente vimos manifestações contra o aumento da tarifa de transporte, e pelo mundo manifestações pela queda de regimes antidemocráticos.

A mobilização é característica do envolvimento político, nós como cidadãos temos o dever de participar da política, defendendo nossos posicionamentos, que, aliás, é outra característica do envolvimento político. Assumir posição diante dos interesses da sociedade, escolher um lado e defendê-lo. O povo faz isso ao protestar, por exemplo, quando o que lhe incomoda e o que lhe insatisfaz acontecem rotineiramente e reclama. Pude ver isso quando pessoas que não usam o transporte público se solidarizaram aos estudantes, na ocasião da redução da meia-passagem, por entenderem que aquela era uma luta legítima em defesa de direitos.

Ter um ideal e lutar por ele. Lutar com quem tenha como objetivo o desenvolvimento de políticas sociais que sejam capazes de transformar o Brasil num país que ofereça igualdade de oportunidades para todas e todos, para que sejam de fato cidadãos. Isso é fazer política, acreditar, se engajar, defender sua posição, ter um ideal. E você, tem um ideal que o impulsione a lutar? Juntemos nossas mãos e vamos em frente, a mudança virá pela mão da juventude.

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Construir mais escolas ou construir mais presídios?


A diminuição da maioridade penal é um tema que mobiliza a opinião pública, motivada quase sempre pela mídia e após ocorrerem crimes, em especial os hediondos, envolvendo jovens menores de 18 anos, como no caso da morte do menino João Hélio. Hoje, a Constituição Federal define como idade mínima para responsabilidade penal, 18 anos.
O debate que gira entorno do tema é muito amplo e algo que preocupa é o fato de que culturalmente existe nos brasileiros (parte da população) um entendimento de que direitos humanos em caso de assassinatos não devem ser respeitados. Para esta parcela da população, respeitá-los, é desrespeitar as vítimas, esquecendo o direito a justiça. Mas não seria o jovem agressor uma primeira vítima? Em muitos caos sim. E aqui é a opinião de uma pessoa que teve um avô e dois primos assassinados em assaltos. Sempre penso se os que cometeram os crimes tiveram as mesmas oportunidades que eu de estudar em uma boa escola, ter acesso a cultura, esporte, lazer. Lembro que um dos assassinos dos meus primos disse que roubava porque ninguém lhe dava emprego.
Será quem um jovem que cometeu crimes é irrecuperável? O que o levou a criminalidade? Os jovens figuram na criminalidade como vítimas ou infratores como mostra o levantamento realizado pelo Ministério da Justiça em 2005 ao apontar que os jovens entre 18 e 29 estão entre os principais atores nos registros policiais, logo estão enchendo o sistema de execução penal. Dados do PNAD/IBGE2007 mostram que a taxa de encarceramento juvenil pode chegar até a 10,4 para cada 1000 no caso dos homens. A realidade para esses jovens é um sistema prisional falho e com medidas sócio-educativas que não cuidam para uma nova inserção na sociedade, com dignidade.
Vivemos em uma sociedade na qual, comprovadamente o acesso as oportunidades são desiguais, o consumismo é exacerbado e estimulado pela mídia, os jovens expostos a vulnerabilidade. Será que diminuir a maioridade penal resolverá o problema da criminalidade juvenil, ou apenas varrerá para baixo do tapete um problema maior?
Os esforços no enfrentamento à violência e a criminalidade devem estar atrelados a políticas sociais, para que mais jovens estejam nos bancos das escolas, recebendo educação de qualidade, acesso a cultura e lazer, e não apenas ocupando seu tempo. As políticas sociais devem atuar para que os jovens tenham uma visão cidadã da sociedade, com formação completa de direitos e deveres, preparação para conflitos, e maior chance de sociabilização através de oportunidades de trabalho, cultura e lazer. Essas ações são o caminho para a diminuição dos problemas de violência e criminalidade juvenil, reforçando valores democráticos, participação e desconstruindo preconceitos.
Cuidar é melhor que punir.

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

ARTIGO MARILIA ARRAES

Miss: rainha de quê?




Sinto-me especialmente feliz por conseguir me indignar frente a coisas simples e relativamente bem aceitas pela sociedade. Um exemplo são os tradicionais concursos de miss.

Quantas mulheres, ao longo da história, dedicaram suas vidas a combater o machismo, a conquistar o espaço que temos hoje. Mulheres que viveram e enxergaram além do seu tempo e, por isso, foram estigmatizadas, hostilizadas e sofreram todas as "sanções sociais" possíveis.

Hoje, procuramos nos qualificar profissional e intelectualmente. Aprendemos idiomas estrangeiros para alcançar novas culturas e novas oportunidades - não, apenas, por ser obrigação de uma moça fina. Batalhamos, todos os dias, no mercado de trabalho, para receber, no mínimo, o mesmo salário que os homens, ao executar o mesmo trabalho. Brigamos em casa para que nossos companheiros dividam as tarefas domésticas e, consequentemente, compatilhem conosco o "terceiro expediente". No trabalho, elogios e assédio ainda se confundem e as dúvidas sempre pairam sobre quem não se submete. Afinal, é mais fácil encontrar uma subalterna vadia, do que um chefe tarado.

Nosso corpo é só nosso e, por isso, temos que brigar, ainda, com a Igreja e com o Estado, para que compreendam isso e nos permitam cuidar dele como nos convenha. Por falar em corpo, temos mesmo que cuidar dele muito bem, porque há grandes chances de sermos discriminadas, caso estejamos muito distante dos padrões de beleza. Quantas são admiradas por serem chefes de família, por criarem seus filhos e serem mães e pais ao mesmo tempo? Tenho a certeza, também, de que hoje as mães sonham que suas filhas ocupem, em igual quantidade e qualidade, cargos de chefia, diretorias, presidências. Poucas décadas atrás, o principal anseio das mães para felicidade de suas filhas era mais difícil de alcançar: que fizessem um bom casamento (seja lá o que isso significasse), tivessem muitos filhos e fossem felizes para sempre.

Em meio a todo esse contexto, vemos concursos de beleza de todo tipo. Miss disso ou daquilo, musa, garota, rainha, princesa. Desfilam, dançam, respondem abobrinhas, coisas ridículas e medíocres ou, no mínimo, memorizadas e falsamente vomitadas ao microfone. São ridicularizadas, servem de chacota, seja por serem bonitas e terem falado absurdos, seja por não cumprirem com os padrões - locais ou "universais" - de beleza imposto nos concursos. No final, a vencedora ganha uma faixa, um cetro e uma coroa. Acena doce e passivamente à multidão, chora de emoção, agradece, vai embora. Em resumo, representa tudo o que sempre nos tentaram impor e que esbravejamos para não permitir. Aceitam pacificamente discriminação social e racismo evidentes em TODOS esses concursos, e assumem, tacitamente, que a beleza é o que uma mulher pode oferecer de melhor. Afinal, o que mais elas oferecem nesse concurso? Habilidades? Conhecimentos? Cultura?

Esse ano, o Miss Universo acontecerá no Brasil. Para quê? Não precisamos de uma rainha, temos uma presidenta eleita pelo voto direto. Já colocamos a faixa no peito de uma mulher que não é bonita, não é jovem, nem loira, alta e magra. Tem o corpo castigado por lutar pela democracia e pelo povo do seu país. Por não ser doce, dócil, passiva, submissa, tem fama de ser dura, fria, grossa. E, no Brasil governado por esta mulher, tantas outras morrem assassinadas por seus companheiros; morrem de parto ou de complicações por aborto inseguro; são violentadas e exploradas sexualmente; trabalham no campo e na cidade, em casas de família, na informalidade e não têm seus direitos trabalhistas respeitados. Para que uma rainha da beleza, se temos mais de 22 milhões de mulheres chefes de família. Em nossa História, recente e remota, temos tantas mulheres que nos orgulham e nos fazem acreditar que vale à pena lutar por um mundo melhor. Não, definitivamente não precisamos de títulos como esses.

Por tudo isso e em respeito às mulheres do Mundo, eu não assisto ao concurso de Miss. E você?

Marília Arraes, vereadora do Recife pelo PSB